Por que passamos menos tempo com família e amigos
Embora esta seja considerada uma das atividades que mais trazem felicidade e sensação de bem-estar, a maioria dos adultos diz passar pouco tempo com sua família e os amigos — em números, a média fica em torno de 1h de qualidade por dia. Com base nisso, um grupo de Cientistas Comportamentais liderado pela Ashley Whillans decidiu pesquisar as possíveis causas dessa afirmação.
Ao longo de 2021, elas realizaram um estudo envolvendo três experimentos e uma pesquisa, e analisaram uma base de dados de mais de 77 mil pessoas. Os resultados apontam para um fator: bônus e incentivos sobre performance.
Esse tipo de benefício financeiro exerce um papel crítico sobre a forma como decidimos alocar nosso tempo em diferentes esferas de relacionamento. Isto porque ele faz com que as relações de trabalho sejam percebidas sob uma ótica mais instrumental, levando as pessoas a priorizá-las em detrimento das relações de caráter pessoal.
Incentivos já foram testados com sucesso em vários âmbitos. Estudos apontaram que, em determinadas circunstâncias, eles podem
- aumentar o desempenho acadêmico;
- influenciar comportamentos mais saudáveis;
- incentivar pacientes a tomar suas medicações de forma correta;
- incrementar a produtividade de times de vendas, atendentes de call center, além de resultados trimestrais (embora no curto prazo), quando CEOs recebem stock options
Há ainda uma extensa literatura investigando suas consequências: se efetivamente aumentam a produtividade ou apenas os esforços dedicados a tarefas específicas, e se têm um efeito rebote na motivação intrínseca.
Para além desses tópicos, existem análises em relação a preconceito de gênero, comportamento ético, importância atribuída ao dinheiro e relações sociais — como este estudo de Whillans e colegas.
Aqui, uma questão importante vem à tona: a saliência. O fato de haver tais incentivos destaca a busca individual pela maximização dos ganhos. Por exemplo: se um vendedor de carros ganha uma comissão por cada veículo vendido, toda transação finalizada servirá como lembrete monetário, reforçando comportamentos orientados a ganhar mais dinheiro.
Essa busca por recompensas financeiras, portanto, molda a percepção de instrumentalidade de várias relações sociais, ou seja, a forma como enxergamos as outras pessoas como úteis (ou não) para nos ajudar a atingir um determinado objetivo. Assim, e sob essa perspectiva, amigos e família podem ser interpretados como “menos instrumentais” e preteridos na divisão do tempo.
No estudo, algumas hipóteses foram testadas — e validadas! — , considerando que a exposição a incentivos por performance:
- Aumenta a prioridade atribuída às relações de trabalho: as pessoas se tornam mais propensas a socializar com colegas de trabalho, mesmo que isso implique em sacrificar tempo com familiares e amigos;
- Aumenta a percepção de instrumentalidade das relações de trabalho: a socialização com colegas de trabalho é percebida como um caminho válido e importante para alcançar objetivos profissionais
Sugestões para uma nova abordagem
Nem sempre percebemos, principalmente no curto prazo, mas ao priorizar as relações profissionais dedicando mais tempo a elas, estamos sacrificando fatores importantes associados à felicidade e ao bem-estar.
Por esta razão, as autoras sugerem que empresas e gestoras(es) comecem a valorizar seus(as) colaboradores(as) em um contexto relacionado ao tempo, recompensando as pessoas com folgas, dias adicionais de férias e reduções de jornada ao invés de dinheiro.
Essa mudança de paradigma é importante, bem como apoiar colaboradores(as) a realmente aproveitar esse tempo, deixando de lado a impressão de que têm de estar trabalhando o tempo todo.
Saiba mais
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